Ludymila Siqueira
Goiânia - Os cães são conhecidos por suas características de doçura, amigabilidade, afetividade incondicional e lealdade, qualidades que os tornaram conhecidos como "o melhor amigo do homem". Além dessas virtudes, a ciência tem comprovado que esses animais podem contribuir significativamente para a saúde mental e física das pessoas com quem mantêm uma relação próxima. Com base nisso, surgiu a Terapia Assistida por Animais (TAA), um método terapêutico e educacional que utiliza essas habilidades em prol da saúde humana.
Graças à facilidade de adestramento e ao temperamento equilibrado, os cães são os mais utilizados na TAA. Contudo, outras espécies também podem ser empregadas, como cavalos na equoterapia, além de gatos, aves e até animais exóticos, como furões. A escolha do animal depende de sua capacidade de interagir de maneira segura e eficaz com os pacientes. Para serem selecionados, os animais precisam ser sociáveis e capazes de criar um ambiente terapêutico harmonioso.
Em Goiás, diversos hospitais públicos e privados adotam a TAA com cães. Esses animais atuam como facilitadores no processo terapêutico, com o objetivo principal de minimizar os impactos negativos das internações e dos tratamentos prolongados. Eduardo Carneiro, gerente de Reabilitação do Centro Estadual de Reabilitação e Readaptação Dr. Henrique Santillo (Crer), destaca que os resultados são muito positivos em diversos aspectos da saúde dos pacientes.
Pacientes internados no Crer recebem visita de cães terapeutas (Foto: arquivo Crer)
"A visita de animais em ambientes de saúde agrega inúmeros benefícios aos pacientes, como a redução do estresse e da ansiedade, o apoio emocional, a estimulação motora, o aumento da adesão ao tratamento e a melhora na interação social, proporcionando uma abordagem mais humanizada e centrada no bem-estar integral do assistido. Além de beneficiar pacientes e familiares, a terapia também é vantajosa para os profissionais de saúde, contribuindo para a humanização do ambiente hospitalar e aliviando parte do estresse no cotidiano", explica Eduardo Carneiro em entrevista ao jornal A Redação.
Com essa premissa, o projeto de extensão TAAUFG, da Universidade Federal de Goiás (UFG), desenvolve, desde 2016, a terapia assistida por cães. Criada por estudantes dos cursos de Medicina e Medicina Veterinária, a iniciativa tinha como foco inicial levar conforto, distração e leveza às crianças internadas por longos períodos na unidade pediátrica do Hospital das Clínicas (HC-UFG), em Goiânia. Diante dos resultados positivos, o projeto cresceu rapidamente e foi premiado como o melhor projeto de extensão da instituição federal em 2018.
Atualmente, o projeto atende outras unidades de saúde, como o CRER, o Hospital da Criança e a Santa Casa de Misericórdia. A coordenadora da iniciativa, a médica veterinária e professora Kellen Oliveira, ressalta a importância das interações entre pacientes e animais, especialmente para aqueles em longas internações. "É uma maneira de quebrar a rotina dos pacientes e de seus familiares. O afeto transmitido pelos cães gera acolhimento e promove o bem-estar", afirma.
"Temos muitos relatos de pacientes que inicialmente se recusavam a interagir com a equipe hospitalar, mas que mudaram de comportamento após a visita dos cães. Isso demonstra o poder da interação social proporcionada pelos animais. O mesmo ocorre com crianças tímidas que, após a TAA, começam a se abrir com a família e com as equipes multiprofissionais", comenta Kellen. Além dos cães, o projeto também inclui a interação com um jabuti, voltada para pacientes que têm medo ou traumas de cães, ou que nunca tiveram contato com animais de estimação não convencionais.
Voluntários do TAAUFG em visita ao Crer (Foto: arquivo pessoal/médica veterinária Kellen Oliveira)
No projeto TAAUFG, os cães que realizam os acompanhamentos pertencem a tutores voluntários e passam por uma rigorosa seleção clínica, que avalia tanto a saúde quanto o comportamento dos animais. Os tutores recebem um cronograma semestral, no qual se comprometem com os dias e locais das visitas. Segundo a coordenadora Kellen Oliveira, na Terapia Assistida por Animais (TAA), os profissionais de medicina veterinária desempenham um papel fundamental, sendo responsáveis por avaliar a saúde e o comportamento dos cães.
Além disso, eles auxiliam tecnicamente a equipe médica e hospitalar, orientando sobre as diretrizes antes, durante e após as visitas. Essas orientações incluem cuidados higiênicos, prevenção de doenças e a observação de sinais de cansaço, estresse ou qualquer comportamento que possa comprometer a saúde do animal ou do paciente. O projeto também é coordenado pela professora do curso de Farmácia Nathalie Dewulf e pela professora de Medicina Alessandra Vitorino, que trabalham em conjunto para garantir a qualidade e a segurança das interações entre os animais e os pacientes.
TAA contribui para o desenvolvimento infantil em tratamento interdisciplinar
A Terapia Assistida por Animais (TAA) pode ser aplicada a qualquer pessoa, mas tem sido amplamente utilizada para promover o desenvolvimento biopsicossocial, especialmente de crianças com dificuldades físicas, emocionais, cognitivas e sociais. Especialistas destacam que a terapia tem mostrado resultados significativos na melhora da cognição, fala, socialização, autoestima, autocuidado e desenvolvimento físico desses pacientes.
Em Goiânia, o projeto Centro Universal de Referência em Assistência Animal (Curaa) realiza um trabalho fundamental com cães terapêuticos, ajudando crianças em tratamento interdisciplinar, como é o caso de Rodrigo. O garoto, diagnosticado com Transtorno de Ansiedade e Transtorno do Espectro Autista (TEA), recebe o apoio do cão de serviço Saturno, treinado para fornecer suporte emocional durante momentos de crise.
Segundo Elaine Bezerra, coordenadora e cofundadora do projeto, os cães passam por testes de aptidão natural desde filhotes para identificar suas sensibilidades. Aos 15 meses, se apresentarem facilitação terapêutica, forem domesticados, possuírem temperamento equilibrado, comportamento pacífico e saúde perfeita, são direcionados para atividades específicas de assistência.
(Foto: Ludymila Siqueira/A Redação)
A equipe do jornal A Redação acompanhou uma manhã de terapia assistida com o cão AXL, do projeto Curaa, voltada ao apoio pedagógico infantil. O atendimento ocorreu em uma clínica de desenvolvimento localizada no Setor Sul, em Goiânia. No local, as crianças ficaram encantadas com o pet. Algumas pulavam de alegria ao vê-lo, enquanto outras, mais reservadas, inicialmente demonstravam certa desconfiança.
Apesar da grande movimentação, AXL, um dócil Golden Retriever, permanecia atento a qualquer sinal diferente. Conhecida por sua sensibilidade, a raça tem habilidade especial para detectar alterações emocionais. Elaine, uma das responsáveis pelo projeto, explicou que AXL consegue identificar quando uma criança está prestes a ter uma crise. "Ao menor sinal de que ela está cruzando os braços, ele tenta intervir, pois a maioria das crises começa com esse gesto. Ele é treinado para perceber isso por meio da respiração e dos batimentos cardíacos acelerados", detalhou.
A reportagem presenciou a transformação no comportamento das crianças ao interagirem com o cão. Inicialmente relutantes, aos poucos elas conquistam confiança e logo estão brincando com AXL. "Onde ele chega, transforma o ambiente. Chego a arrepiar, porque há inúmeros relatos desse impacto positivo", conclui Elaine, demonstrando orgulho.
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